"O Do It Yourself nasceu nos anos 70 no seio de grupos (punks, anarquistas, hippies, cybers, e todo tipo de mix possível) que rejeitavam a industrialização, isto é, um modo de produção e consumo massivos responsável pela alienação de produtores e consumidores. A busca de alternativas suscitou o compartilhamento de saberes e fazeres que configurou um movimento social e cultural bem amplo. No design, esse movimento teve figuras e momentos importantes como o italiano Enzo Mari e sua Proposta per un’Autoprogettazione onde apresentava 19 móveis com seu respectivo passo-a-passo de fabricação e convidava as pessoas a trocar projetos com ele. Essas trocas “empoderavam” indivíduos, coletivos, pequenas comunidades. Ao projetar nossos habitats e objetos, projetamo-nos na vida com os outros.
Hoje, o Faça Você Mesmo ganha um novo fôlego em parte por conta da crise econômica (crise do próprio capitalismo) e parte por conta da crise ambiental (crise do planeta): Como consumir sem gastar? Como produzir sem poluir? Como reduzir os desperdícios da produção industrial de grande escala sem deixar de atender às grandes demandas que existem? Como cooperar mais do que competir? Como compartilhar mais do que comprar?
Na Europa, no campo do design, vem a experiência do Recession Design que, como o nome indica, nasce nesse clima de recessão. O coletivo Recession Design realiza um DIYsign: são projetos com materiais, técnicas e processos simples mas que constituem um design de qualidade.
Esse DIYsign tem algo a ver com o que eu venho chamando de Dizáini. Sempre achei que, pela sua sonoridade, a palavra “design” era complicada de ser usada aqui no Brasil. “Sou designer” é complicado de dizer antes mesmo de começar a explicar. E sempre achei que no Brasil vivemos uma situação paradoxal de escassez econômica crônica e de imensa riqueza sociocultural. Um paradoxo que gera um big potencial para as práticas criativas mas que deixamos de experimentar por conta da hegemonia de um design de origem européia e sobretudo alemã. Gosto de pensar num Dizáini que nasce das gambiarras. Não se trata de fazer uma apologia romântica mas de não deixar de reconhecer suas qualidades técnicas e estéticas. É num contexto de recessão econômica nos EUA e na Europa e escassez crônica no Brasil que técnicas artesanais tradicionais se articulam com novas tecnologias digitais, customizando produtos e serviços como também modos de vida e apontando um horizonte pós-industrial que se faz sempre mais urgente. Urgência de repensar a relação entre quantidade e qualidade não significa andar para trás. Não há volta atrás no sentido de uma eliminação de certos consumos: luz, por exemplo. Como determinar o que o outro pode ou não pode consumir? Quem determina? A quantidade entre quantidade e qualidade é uma questão ética e não um moralismo triste.
Me lembrei da palestra de outro italiano, o Ezio Manzini, que diz que o designer deveria apostar na qualidade: na qualidade das relações; na qualidade do trabalho (do fazer bem feito pode ser artesanal mas não apenas); na qualidade da escala: privilegiar escala mais humana, que certamente não é a macro mas não necessariamente é a micro: encontrar a escala adequada; na qualidade do lugar, um lugar que se afasta do território identitário e se aproxima de um espaço de afinidades; e, por fim, na qualidade do tempo: tomar seu tempo. E todas essas qualidades implicam uma complexidade. A era moderna procurou reduzir a complexidade a um modelo simples. E hoje, nós, ocidentais, re-descobrimos a complexidade quando estamos completamente enrolados. Ora ninguém dirige a complexidade sozinho. Daí a necessidade de colaboração e cooperação. Ao “User-centered design” onde ainda temos um indivíduo com carências, Manzini prefere o “Design colaborativo” onde indivíduos, coletivos e comunidades articulam suas potências para resolver seus problemas.
O Faça Você Mesmo do século XXI é “com os outros"! Proponho considerar pelo menos três eixos entremeados: um eixo tecnológico-ambiental que mistura analógico e digital, low tech e high tech; um eixo psicosociocultural que mistura uma rica cultural tradicional à atual cultura que não é necessariamente digital como vimos no item anterior mas certamente de colaboração e compartilhamento e que considera o Eu na relação com o Outro; e um eixo econômico-político que contrapõe exploração e alienação com autonomia e empoderamento e, sobretudo, nesse horizonte pós-industrial, a hibridação não apenas de mercados de massas com mercadinhos de nichos, como também o saque e a dádiva. DESIGN / DIY-SIGN / DIZÁINI, vámu nessa!"
Texto de autoria da professora Barbara Szaniecki publicado em outubro de 2013.
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