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13.9.11

Bate papo com Rafael Cardoso



Neste bate papo o Amenidades do Design oficializa o seu apoio a iniciativa da Ong LAD (Laboratório Avançado em Design) que tem por objetivo principal valorizar o estudo e a prática do Design nos campos acadêmico e profissional. Demonstrando seus objetivos, o LAD compartilha com o Amenidades do Design uma entrevista exclusiva com um grande incentivador da pesquisa sobre a história do design no período anterior a 1960, doutor em História da Arte e escritor de livros importantes da História do Design Brasileiro :-) Rafael Cardoso.




Prof. Rafael, por favor, conte um pouco da sua trajetória...

Rafael Cardoso - Fiz doutorado em História da Arte no Courtauld Institute of Art, Universidade de Londres, entre 1991 e 1995. Em 1996, voltei ao Brasil e passei cinco anos como professor da Esdi/Uerj, primeiramente como bolsista recém-doutor pelo CNPq e, depois, como professor visitante. De 2000 a 2010, fui professor do Departamento de Artes & Design da PUC-Rio. Em julho deste ano, saí da PUC e voltei para a Esdi, novamente como professor visitante. Tenho realizado bastante pesquisa na área de história da arte e do design no Brasil, especialmente com referência ao período 1850 a 1930, resultando em meia dúzia de livros. Também sou escritor, com três livros de ficção publicados. Atuo ainda como curador de exposições e perito judicial.





No prefácio da 1ª. edição do livro "Uma Introdução à História do Design Brasileiro"(para ser lido por quem já entende do assunto) começa com uma provocação... "o livro (...) tem tudo para desagradar a quem chega ao assunto com ideias formadas... e cabe dizer logo de cara que ele não pretende se esquivar da tarefa de incomodar, pois questionar, subverter e até contrariar as opiniões preconcebidas fazem parte do trabalho do historiador".

Mais abaixo você afirma: "o design já é um campo prolífico em rixas e sectarismos e este livro tem como propósito maior estimular a consciência do riquíssimo legado histórico que têm em comum. Acima de tudo, espero que as ideias contidas nestas páginas sirvam para agregar forças e não para dispersá-las." Parece que existem linhas de pensamento sobre a história do design que se iniciam em tempos distintos e por isso mesmo, cada qual possui uma história específica. Quais são as vantagens e desvantagens dessa ramificação de pensamentos?

Rafael Cardoso - É importante que existam divergências de opinião. O debate é sempre bom. Apenas, deve ser um debate qualificado, baseado em estudo e pesquisa e mantendo um alto nível intelectual. Quem trabalha com design precisa entender que a História é um campo distinto, com suas próprias metodologias e regras. O trabalho de fazer história deve ser deixado para os historiadores. Nenhum designer iria achar bom se um historiador começasse a dar opinião sobre como projetar. Está mais do que na hora de deixarmos para trás o 'achismo'. Esse prefácio foi escrito dez anos atrás. As coisas mudaram bastante, para melhor, desde então. Mas, ainda vejo alguns designers e professores repetirem afirmações errôneas ou absurdas em nome da 'verdade histórica'. Sempre que alguém encher a boca para falar em nome da história, pergunte-se o que essa pessoa realmente entende do assunto. É muito fácil distorcer o material histórico para servir aos próprios fins.





O design gráfico se desenvolveu no Brasil, quase paralelamente com os demais países europeus, conforme consta no último livro "Impresso no Brasil, de 1808 a 1930" produzido pela sua organização. Dado que existe já uma tradição em termos de design gráfico no país demonstrada por esse e outros livros de sua autoria, porque ainda persiste a ideia que os designers daqui não fazem um trabalho de qualidade e invariavelmente, empresas de grande porte brasileiras buscam designers e designs de fora? Essa realidade tem alguma relação com a falta de percepção da tradição do design antes de 1960?

Rafael Cardoso - O assunto é complexo. Talvez tenha menos a ver com uma percepção histórica do que com outras questões de mercado. Em alguns casos, o designer brasileiro tem dificuldade de se posicionar. Conheço ótimos profissionais, excelentes projetistas, que não sabem explicar ou defender o que fazem. Chega alguém com outra bagagem cultural e bons instrumentos de convencimento, e ganha o cliente. Foi o caso com o redesenho da identidade visual do Bradesco, anos atrás, que eu considero péssima.





Muitos autores de artigos e livros afirmam que a escola de Bauhaus foi pioneira no estudo do design. No entanto, artigos de sua autoria, como "As origens históricas do designer: algumas considerações iniciais" e de outros autores, como do Arquivo Nacional, em "O Arquivo Nacional e a História Luso-Brasileira: a vida artística urbana", alegam existir uma metodologia de ensino de design já no século XIX. Como isso muda o nosso entendimento acerca da teoria do design na atualidade, caso fossem totalmente aceitas essas últimas premissas?


Rafael Cardoso - Não é alegação. É fato mais do que estudado e comprovado. O ensino do design teve início no século 19. Há livros e mais livros sobre o assunto. O exemplo mais notório e incontestável é o sistema de South Kensington, que promoveu o ensino do design na Grã-Bretanha a partir da década de 1850. Se não existia ensino de design antes da Bauhaus, gostaria que alguém me explicasse sobre o que eu passei quatro anos pesquisando na Inglaterra. rsrs.




Conforme entrevista "uma cosa mentale" concedida por você para o Itaú Cultural, o design está se tornando fluido, embora percebido visualmente, provoca muito mais emoções e sensações do que os prazeres decorrentes da tangibilidade, em função disso, como se pode definir hoje o design?


Rafael Cardoso - Não foi exatamente isto que quis dizer. A tangibilidade não desaparece, de modo algum. Aliás, quanto mais proliferam as 'não-coisas', no dizer de Vilém Flusser, mais o mundo se enche de 'coisas', em paralelo. Quanto às definições de design, fujo delas sempre que possível. As definições limitam, encerram, e eu quero é ampliar a discussão.





Parece existir contradição entre design gráfico e sustentabilidade. A profissão requer meios impressos para a comunicação, no entanto, para ser sustentável, quanto menos peças impressas melhor. Esse fato parece empurrar o designer gráfico para ser efetivamente um webdesigner. Qual é o futuro da profissão no mundo fluido?


Rafael Cardoso - Não vejo contradição alguma. A fabricação de papel é um dos problemas ambientais mais passiveis de ser equacionado. Já existem meios confiáveis de manejo de florestas e certificação de fibras e processos industriais. Além do mais, papel é relativamente fácil de reciclar. Melhor de tudo: livro é o exemplo perfeito de um produto que ninguém quer jogar fora e que muitos cultuam como preciosidade. A indústria gráfica irá se adequar aos novos tempos muito mais rapidamente do que outras. Não acredito nessa história de fim do livro. Isso é intriga da concorrência! rsrs.





O livro "Uma Introdução à História do Design Brasileiro" parece-me que marcou um novo caminho para o entendimento da história do design brasileiro. Algumas obras de historiadores se destacam como "divisores de águas". Essa e as demais obras organizadas por você ou de sua autoria se enquadram nesse ideal? Porque?


Rafael Cardoso - Não sei. Se você pensa assim, agradeço o elogio. Não sei a resposta, sinceramente. Talvez tenha sido a obra certa na hora certa. O autor nunca sabe o que vai agradar ao público, ou não. Alguns dos livros que considero meus melhores não foram muito bem recebidos. Se eu soubesse a fórmula, talvez conseguisse acertar mais.




Por favor, diga algo para os alunos...

Rafael Cardoso - Caros alunos de design: obrigado por lerem meus livros! Espero que eles tenham contribuído para a formação de vocês. Se há algo que aprendi nos anos em que atuo como professor, é a importância da leitura. O melhor designer é aquele que possui boa e sólida formação cultural. Isto, só se adquire por meio da leitura.


Capas dos livros O Design Brasileiro antes do Design e Impresso no Brasil, ambos de Rafael Cardoso que também escreveu o livro Uma Introdução à História do Design.



Entrevista em parceria com a ong LAD - Laboratório Avançado em Design.


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Esta entrevista foi feita pelo Laboratorio Avançado em Design em 2011.
Não deixem de conferir a postagem Una cosa mentale para um mundo complexo como forma de atualização ou complementação desta entrevista. 

6 comentários:

  1. Anônimo15.11.11

    Muito bacana a entrevista. Recentemente terminei de ler o Design Brasileiro Antes do Design, e ele mostra muito desse pensamento de que existiu design antes de 1960, vale muito a pena o livro.

    Ass.: Ronildo Abijaude

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  2. Psiu, uma errata: o livro de 2000 chame-se "Uma Introdução à História do Design", totalmente genérico. Os livros que falam de Design Brasileiro são posteriores.

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    1. Obrigada pela correção pertinente :)
      Seja bem vinda!

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  3. O Rafael esqueceu de mencionar toda a sua trajetória... que, não começa no Design. Vem de uma graduação em sociologia e, as portas que lhe abre no Courtauld Institute of Art, Universidade de Londres, passa pelo Mestrado em História da Arte, na Escola de Belas Artes da UFRJ... é um detalhe mas...pode ser uma dica, para aqueles que irão se interessar pela história do Design, ou uma formação continuada nesse campo.

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    1. Agradeço a informação e preciosa "dica" professor Valdir :)

      Fico feliz em tê-lo por aqui!
      abs de uma ex-aluna da EBA
      Carol Hoffmann

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